Recebi de uns amigos o vídeo
acima com este depoimento de uma menina de 8 anos sobre sua crença no ateísmo
e a sua relação com a colegas, professores e a escola em geral. O vídeo teve
muitas visualizações no Youtube e a menina é sem dúvida muito
esperta e inteligente, além de muito simpática. Algumas pessoas podem ter recebido o vídeo com indiferença, ou mesmo tê-lo meio que desprezado por se tratar de uma criança, mas eu achei bastante interessante.
Bem, eu levo a sério o depoimento
dessa criança. Sabendo, é claro dos limites da idade e da influência que o seu
meio exerce sobre ela, além é, claro, do fato de que ela não postou o vídeo
sozinha e nem sabe ao certo como é que o vídeo se encaixa no movimento de que
ela participa e menos ainda como pode ser utilizado no debate cultural contemporâneo.
Mas eu levo a sério por também ter questões bem sérias já por volta dessa idade. Eu me afligia com a passagem do tempo e não acreditava no ensino religioso que recebia na época. Para ter uma ideia, eu cheguei a sentar de costas para o altar quando meus pais me levaram à Missa algumas vezes, em sinal de protesto, e com 10 anos eu me neguei a professar, conscientemente, "Creio na Santa Igreja Católica", na minha Primeira Comunhão. E para mim eram atos sérios, que praticava com consciência.
Mas eu levo a sério por também ter questões bem sérias já por volta dessa idade. Eu me afligia com a passagem do tempo e não acreditava no ensino religioso que recebia na época. Para ter uma ideia, eu cheguei a sentar de costas para o altar quando meus pais me levaram à Missa algumas vezes, em sinal de protesto, e com 10 anos eu me neguei a professar, conscientemente, "Creio na Santa Igreja Católica", na minha Primeira Comunhão. E para mim eram atos sérios, que praticava com consciência.
E tive ainda sérias questões
sobre a relação entre as crianças e a religião que podem ser lidas aqui. E somente aos 13 anos, depois de uma forte experiência religiosa foi que me converti ao catolicismo. E com isso não pretendo realizar nenhuma forma de proselitismo barato, mas apenas apresentar um fato importante para o meu argumento.
Agora, o que vídeo dá entender
sem dizer, what goes without saying,
é a ideia de que há crianças sofrendo bullying
dos colegas em várias escolas por serem ateias e de professores obrigando as
crianças à oração. Bem, nada mais fora da realidade.
Nas últimas semanas estive
procurando com minha esposa uma escola católica para nossa filha mais velha e
foi difícil encontrar uma escola católica que, por mais estranho que possa
parecer para quem não está familiarizado com a discussão, lecionasse ensino religioso
católico. Não sei se os ateus e praticantes de outras religiões percebem esta
dimensão do catolicismo contemporâneo. Quando vêm com essa discussão de
fundamentalismo religioso, percebo que estamos em universos paralelos. E é preciso
construir uma ponte, interestelar, que seja.
Na grande maioria das escolas
católicas, a aula de ensino religioso é inter-religiosa, não-confessional e as
aulas de catequese, em que se apresenta a fé católica, são fora do horário de
aula para as crianças das famílias que assim desejarem. Mesmo em escolas com
ensino religioso católico, crianças evangélicas, de outras religiões ou de
religião nenhuma são admitidas e não são obrigadas a participar de todas as
atividades, mesmo tendo escolhido livremente estudar em uma escola católica.
As escolas católicas têm tanto
receio de impor ou apresentar subliminarmente a sua fé, que em certos círculos
católicos discute-se se esse processo não nos levou ao excesso de perdermos
nossa própria identidade. Há um intenso debate dentro da Igreja Católica se o
diálogo com o mundo moderno ao longo do século XX não terminou por gerar uma
“auto-secularização” católica.
E por mais importante que seja
esse debate, aqui só quero apresentá-lo para dizer quão longe o movimento
ateísta está da realidade ao falar, ou sugerir, a perseguição de crianças e
adolescentes ateias nas escolas. É um completo absurdo. Absurdo nas escolas
católicas, que são a maioria das escolas religiosas brasileiras.
Acredito que o diálogo, a
tolerância e o respeito à diversidade (e diversidades de verdade, como entre os que
não creem e os que creem, por exemplo) juntamente com o amor e a busca pela
verdade, aquela que é única e nos faz todos humanos, pode ser o elo e o fio
condutor da sociedade brasileira pós-moderna e plural que está emergindo em
nossas metrópoles e deve avançar pelas próximas décadas.
E para que isso aconteça, é
preciso que nos levemos a sério. Os ateus talvez não saibam quão a sério a
Igreja Católica os toma. Os diálogos do Papa Bento XVI com Habermas e Paolo
Flores d’Arcai e do Papa Francisco com Scalfari são ilustrativos nesse sentido.
Mas também precisamos ser levados a sério.
Penso que as famílias podem se
organizar em associações nas escolas públicas para que seus filhos recebam
educação religiosa de acordo com suas crenças e valores. Ou que não recebam
educação religiosa, mas outra coisa que julguem mais pertinente. E acho que
isso é perfeitamente factível em parceria com igrejas, associações e movimentos
sociais, podendo, inclusive, criar um ambiente propício para o diálogo. Pois
que para que o diálogo aconteça é necessário que exista antes identidade e diversidade.
Não há por que imaginar que afirmar nossa identidade seja uma forma de afronta.